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Sobre Antonio Miranda
 
 


 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 
 

INEZ ETHNE
( Brasil – Mato Grosso )

 

Nasceu em Minas Gerais, Divinópolis.
Morou em Goiânia, vive em São Félix de Araguaia, MT.

Fez Sociologia e chegou a começar Jornalismo...
Em 1978 foi para a região do Araguaia, em MS, como ela diz "para fazer trabalho popular e viver no meio de povo.  Chegou a ser assessora dos Trabalhadores Rurais da região.

 

POETAS DO ARAGUAIA. Prefácio de Carlos Rodrigues Brandão.  Rio de Janeiro: CEDI,  1983.  132 p.  ilus              Ex. bibl. Antonio Miranda

 

NA CHAMA LÍQUIDA DO RIO

Não hei de revelar-te
os versos que fiz
quando o banzeiro louco do rio
era um intervalo
entre o recolher do sol
e um prenúncio de lua.

Era vento, era festa,
era medo
náufragos e ressurgidos
no turbilhão das tardes.
Eram as vozes
tremulando na fumaça de candeia
e mãos pesquisando gestos no vácuo.
Era o pavor de perguntar
e o espanto de responder.
Era o encontro com a luz,
a comunhão com a penumbra
e pedido de perdão
que, em silêncio,
a gente faz a liberdade
e o gesto de reprimir o carinho.


Era apenas o rio
que vinha mergulhar meu peito
em noite de ventania.

E no amanhecer
o rio era como deserto líquido
levando na branda correnteza
a canoa pequena e frágil
— na placidez e no banzeiro —
a canoinha que alagou
porque o remador estava embriagado
de sol, de nuvem, de tanta luz
e tanto amor!

Os peixes saltitantes
dançam em minhas veias
— no meio das águas — o coração
sangrando na chama líquida do rio...


***


Meus silêncios
ruminam histórias.
Conto devagarinho
em cada vai e vem da lua.
Vou dizendo:
o coração virou poeira
vai desaguando no rio.

Parei para olhar.
Desenterrar o tempo.
Inverno atrás de verão
e verão atrás de inverno,
a vida se adiantando.
 

***


PAULINA

Parece canto de passarinho na mata... parece cheiro de manga
que amadurece no quintal... água do rio passeando, chamando,
insistindo...  parece que é gente morena deitada na rede.

Deve ser Paulina. Esteve toda a tarde lavando roupa na grota.
O menino veio com a trouxa na cabeça. Paulina espetou a
roupa nas farpas da cerca. O sol deu em cima nervoso, o vento
chacoalhou.  A moça mais velha pôs as brasas no ferro.
Amanhã, a mulher do doutor arrumará as roupas na gaveta e
dará duzentos cruzeiros à Paulina.

Quando veio mais vento e fio de lua, ela fez chá de folha de
laranja, misturou peixe com farinha de puba e os meninos
sentiram pesada a barriga. Contentes. Cansados de malinar.
Agasalharam-se nos cantos e fecharam os olhos.

Paulina suspirou e deitou-se. Sem devaneios, sem sustos, sem
revoltas. Sonhou com a fonte, com farinha, fogão e uma flor
vermelha que queria plantar em frente à sua porta.

Tinha terminado mais esse dia em sua vida, hoje igual a ontem,
e amanhã igual a hoje.

A lua dissolveu-se na água e a mata se fez cantigas e cheiros...

 

***

        AONDE VAI PARAR O MAR?

Canoa Karajá
singrando o rio
de placidez caminhante
azul entre o verde reto-zigue-zague-negro
do horizonte
e o cinza-vazio-denso-inconsistente-rubro
do céu.
No lado de cá várias vidas
por etapas percorrendo ruas
e compondo o corpo uno de medo e coragem.

A noite
reconduz o povo às suas casas.
Fome a mais, fome a menos...
Dramas camuflados em tristes vestidos
que intentam ser solenes trajes de festa.
Sorrisos ansiosos de conquista
(Porque nos prometeram um dia
que iríamos conquista
a liberdade, a paz e a alegria!)

Conversas naufragantes nas esquinas
nas mesas toscas
na fumaça das lamparinas.
Ardentes anelos que o Araguaia recolhe
e vai levando...
(Aonde vai para o Araguaia?)
—Num afluente do Amazonas?
—No mar de saudades e procuras
de tantas gentes, tantos povos...
(E aonde vai parar o mar?)

 

*

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Página publicada em outubro de 2022

 

 

 

 


 

 

 
 
 
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